E tudo isso está conectado, diz ela. Os ricos estão ficando mais ricos, viajando pelo mundo em aviões que lançam carbono, enquanto os furacões e a seca estão atingindo com mais força as comunidades pobres. Os mares em alta estão engolindo os imóveis costeiros, com efeitos que podem abalar o sistema financeiro. “A mudança climática atinge toda a economia”, disse Wucker a Grist em uma entrevista. “Qualquer outro risco que você olhar no mundo provavelmente terá algum tipo de conexão climática”.
Wucker, estrategista e autora, passou décadas trabalhando em finanças, negócios e questões de política global. Seu livro de 2016, The Gray Rhino: How to Recognize and Act on the Obvious Dangers We Ignore (sem tradução para o português) identificou grandes riscos que são ignorados, embora sejam prováveis e previstos – como, digamos, uma pandemia global. Ela cunhou ao conceito “rinoceronte cinza” em oposição aos raros eventos chamados de “cisne negro”, que pegam todos de surpresa. Do jeito que ela vê, a crise climática não é um perigo lento, mas rápido que muda, digamos, tudo.
“O mundo está ficando mais assustador”, escreve Wucker em seu novo livro, You Are What You Risk: The New Art and Science of Navigating an Uncertain World (sem tradução para o português). “Muitas vezes parece cada vez mais difícil fazer qualquer coisa para exercer controle sobre os riscos que enfrentamos em nossas vidas diárias, muito menos sobre muitos dos riscos globais que todo o planeta enfrenta”.
A publicação introduz um novo vocabulário para falar sobre essas ameaças. Todo mundo tem uma “impressão digital de risco” personalizada que descreve o tipo de pessoa que assume riscos, moldada por sua personalidade, educação e experiências. Fortalecer o seu “músculo do risco” pode ajudá-lo a tomar boas decisões. O livro não se enquadra facilmente em nenhuma categoria: pode aparecer na prateleira de “autoajuda” da livraria ou em uma seção dedicada à economia, negócios ou psicologia. Seu foco se aproxima em examinar situações pessoais e se afasta das crises globais, analisando como as pessoas lutam com escolhas e incertezas.
O lançamento do livro chega em um momento em que as pessoas estão começando a prestar mais atenção às ramificações econômicas das mudanças climáticas. “Houve um grande aumento na atenção aos riscos climáticos”, disse Wucker. No ano passado, seis senadores dos EUA enviaram uma carta à Fannie Mae e Freddie Mac 1 NT: empresas de crédito de capital aberto avisando que o mercado imobiliário não estava preparado para as inundações e incêndios devastadores que se aproximam.
Os ricos estão ficando mais ricos, viajando pelo mundo em aviões que lançam carbono, enquanto os furacões e a seca estão atingindo com mais força as comunidades pobres. Os mares em alta estão engolindo os imóveis costeiros, com efeitos que podem abalar o sistema financeiro
Alguns especialistas dizem que deixar de levar em conta esses riscos climáticos poderia alimentar uma crise financeira como a crise das hipotecas subprime 2 NT: tipo de ativo que ficou famoso na crise imobiliária dos Estados Unidos de 2007. Os investidores estão começando a entender as consequências, diz Wucker, apontando para “enormes ingressos” de dinheiro em investimentos sustentáveis – como fundos ambientais, sociais e de governança – durante a pandemia COVID-19. Os investidores também estão pressionando as empresas a divulgar os riscos representados pelas mudanças climáticas para suas operações e como pretendem enfrentá-los.
Wucker quer quebrar os equívocos sobre a mudança climática, começando com a ideia comum de que é uma ameaça lenta. “Na verdade não é”, disse Wucker. “Está se movendo rápido e está ficando cada vez mais rápido”. Em Chicago, onde Wucker mora, ela diz que o nascer do sol parecia o nascer da lua no outono passado, quando a fumaça de um incêndio florestal do oeste soprou em todo o país. Ela tem um amigo na Austrália cujo irmão se feriu tentando proteger sua propriedade de incêndios florestais. Wucker diz que sua asma piorou muito nos últimos anos, a ponto de ela ter que começar a tomar mais medicamentos para controlá-la (sim, a mudança climática está até piorando as alergias).
Wucker recomenda mudanças de comportamento – como comer menos carne ou abandonar seu SUV pelo transporte público – como uma resposta a uma situação que, de outra forma, parece totalmente fora de controle. Isso dá às pessoas um senso de agência. “Quanto mais cada um de nós sente que pode contribuir para reduzir os riscos das mudanças climáticas, maior é a probabilidade de fazermos algo a respeito”, disse ela. “Isso cria um círculo virtuoso”. Ela cita uma análise da organização conservacionista Rare mostrando que se as pessoas começassem a adotar hábitos ecológicos em grande escala, seus esforços poderiam reduzir as emissões de gases de efeito estufa em todo o mundo em 20 a 37 por cento.
Ela está interessada nas razões pelas quais alguns governos agem sobre a mudança climática, enquanto outros tendem a ignorar a ameaça. É em parte uma questão de valores e diferenças culturais, Wucker argumenta no livro, e os riscos são objetivamente diferentes entre os países, assim como seus recursos financeiros. Ela também identifica uma razão psicológica pela qual alguns países podem ser mais pró-ativos do que outros. “Quanto maior o benefício que você vê para si mesmo, maior a probabilidade de ver algo como menos arriscado”, disse ela a Grist. Isso é verdade para indivíduos, bem como para empresas e governos.
Portanto, os países que ganham muito dinheiro com os combustíveis fósseis – digamos, a Arábia Saudita – têm um incentivo para ignorar os riscos das mudanças climáticas. Por outro lado, aqueles que vêem um benefício para sua economia com a energia limpa são mais propensos a correr o risco de se especializar e inovar, disse Wucker. Considere a Costa Rica, um pequeno país da América Central que se tornou um grande ator na política ambiental internacional. A Costa Rica fez do “ecoturismo” sua marca e também se comprometeu com a descarbonização total até 2050 e com a regeneração de sua floresta tropical. “Lugares que veem um nicho econômico para si próprios em tecnologias limpas e eficientes, se virem algo para eles, é mais provável que entrem nele”, disse Wucker.
Nas páginas finais de You Are What You Risk, Wucker relata o encontro com a ativista climática adolescente Haven Coleman em 2019. Na época, um aluno do 8º ano, Coleman era o co-diretor executivo da Youth Climate Strike nos Estados Unidos. Ela estava faltando à escola todas as sextas-feiras para protestar contra a crise climática, e também havia apelado publicamente aos representantes do Congresso do Colorado que agissem. “Juntos, jovens e estudantes de todo o mundo têm sido capazes de chamar a atenção para a crise climática de uma forma que nós ‘adultos’ falhamos em fazer”, escreve Wucker. “E por que não deveriam? O futuro deles está em risco ainda mais do que o nosso”.
Texto escrito por Kate Yoder. Artigo originalmente publicado em The Grist e traduzido com permissão para o Modefica sob licença Creative Commons. Leia o artigo original aqui.