Especialistas Citam Previsões e Prioridades da Agenda Ambiental em 2021
Por Juliana Aguilera
Fotos: Divulgação // Montagem: Victoria Lobo
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Marcos Xukuru – Cacique do Povo Xukuru do Orurubá e prefeito de Pesqueira (PE)
Sabemos que a Natureza é Mãe e é Morada do Encantamento, e por assim ser, não entendemo-la como objeto de especulação ou negócio, mas sim como fonte de subsistência e de sacralidade, como bem ensinara o Cacique Xikão Xukuru. Infelizmente, nossa sociedade vem degradando aquela que conhecemos também como Meio Ambiente, a partir da emissão de gases na atmosfera, a produção desenfreada e consequentemente o aumento da poluição que mata a tantos viventes. Ao tempo em que acordos internacionais em favor dos ecossistemas e da qualidade de vida são firmados, precisamos começar por nós mesmos tendo consciência ambiental. Compete-nos enquanto seres politizados e politizantes fomentar em todos os espaços, dos pequeninos aos mais velhos, a educação ambiental, única capaz de frear os sofreres do nosso planeta. Encaramo-la como uma das prioridades para o ano de 2021, no qual podemos por meio da formação dos cidadãos (re)criar um ambiente capaz de respirar mais uma vez.
Tantos processos e técnicas já dominamos, como é o caso da reciclagem, da arborização de zonas degradadas, preservação das nascentes, tratamento de esgotos, o combate às queimadas e ao tráfico ilegal de madeira a partir de denúncias aos órgãos de controle; são excelentes começos quando os tornamos em práticas cotidianas. A partir de tais hábitos avançaremos numa discussão mais ampla, capaz de enxergar o todo que é o planeta Terra.
Quando nos entendemos como Natureza entramos no processo de desvelamento e encantamento. O ano de 2021 nos impulsiona a descortinar nossas mentes, ainda exploratórias e sem responsabilidades na maioria dos casos, e abrir-nos ao Meio Ambiente como fonte renovadora da existência. Para isso, cabe-nos pensar ainda mais em políticas públicas capazes de amortecer os danos e de defender a vida nas suas execuções, desde as periferias físicas e existenciais aos grandes centros urbanos e econômicos. Que aprendamos com a simplicidade dos Seres, com a magnificência da Natureza Sagrada, onde tudo transita para o bem-estar, tudo transita para a defesa da Vida.
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Fernanda Riera – Bióloga e pesquisadora, com enfoque em manejo e conservação de aves na Caatinga
As tragédias ambientais vivenciadas nos últimos anos (aqui incluo o surgimento de doenças, como a pandemia de COVID-19) evidenciam a desgovernança na gestão ambiental não apenas em nosso país, mas a nível mundial, e lamentavelmente nos servirão como panorama do que vivenciaremos no ano de 2021, caso continuemos a ser “governados” por autoridades que relativizam a seriedade dos problemas e que trabalham para o desmonte do sistema de proteção do meio ambiente. Neste cenário, o negacionismo científico, encabeçado mundialmente por diversos chefes de governo/Estado (o nosso, inclusive), tenderá infelizmente a receber cada vez mais abertura, produzindo e disseminando sistematicamente a desinformação.
Diante disso, em 2021, anseio seguir na produção de conhecimento científico, com o desenvolvimento de pesquisa aplicada à conservação da biodiversidade brasileira. Em específico, nosso grupo de trabalho tem desenvolvido linhas de pesquisa voltadas ao estudo da biologia reprodutiva da arara-azul-de-lear na Caatinga (espécie endêmica deste bioma e ameaçada de extinção), à ecologia de movimento das araras e sua dinâmica populacional, à conservação de seus itens alimentares (e, por extensão, da vegetação nativa do bioma), à soltura monitorada da espécie (objetivando criar infraestrutura para dar início ao revigoramento de uma de suas subpopulações funcionalmente extintas na natureza), ao conflito com espécies exóticas invasoras, ao problema do tráfico e da caça de animais silvestres, e às atividades de reconhecimento das comunidades locais para estruturação de ações socioambientais futuras.
Em vista disso, tenho como prioridade exercitar diariamente o papel desafiador de cientista enquanto divulgadora do conhecimento à sociedade, necessidade cada vez mais emergente para o fortalecimento da relação ciência-cidadão e também para que nós, enquanto espécie humana, nos reconheçamos parte integrante da natureza e atores de mudança – contribuindo, assim, para frear a desinformação e desenvolver a responsabilidade ambiental.
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Ana Lídia Gaspar – diretora executiva do Instituto Recifes Costeiros (IRCOS)
Minha previsão é de muito trabalho para a continuidade de pesquisas, ações de conservação, conscientização e comunicação na área socioambiental. Principalmente agir na busca de soluções para o enfrentamento da crise ambiental e das mudanças climáticas. Chegamos num ponto em que além da conservação, precisamos falar e trabalhar pela restauração de áreas degradadas. Tanto é que estamos no início da Década de Restauração dos Ecossistemas e, também, da Década do Oceano (declaradas pela ONU).
Portanto, minha prioridade para 2021, agora como diretora executiva do Instituto Recifes Costeiros (IRCOS), é buscar parcerias e recursos para a continuidade de nossas ações de pesquisa e conservação, aliando a tentativas na implementação de soluções para os problemas atuais que os ambientes costeiros vêm enfrentando. Trabalhando principalmente junto ao poder público local (municipal), tanto nas ações de campo, elaboração de projetos, divulgação de resultados, além de auxiliar na gestão e fortalecimento de leis e acordos ambientais municipais. O IRCOS tem um histórico de mais de 20 anos em projetos de conservação marinha no litoral sul de Pernambuco. E tem como um dos principais compromissos monitorar e manter a primeira área de recuperação recifal da costa do Nordeste, estabelecida ainda em 1999 em Tamandaré, PE. Essa área está inserida na APA Costa dos Corais e no Parque Natural Municipal do Forte de Tamandaré.
Então é nessa pegada de inovação e conservação que planejamos seguir com nossos trabalhos em 2021 em parceria com a população local, uma vez que todos nós fazemos parte e dependemos do meio ambiente. Seguimos com esperança de tempos melhores e de um maior reconhecimento sobre a importância de conservação do meio ambiente, firme na persistência e paciência, pois muitas vezes os resultados só aparecem em longo prazo.
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Maysa Santoro – Bióloga, ambientalista e educadora ambiental
Depois de vivermos um 2020 marcado pelo desmatamento e pelo fogo, o ano de 2021 promete trazer mais visibilidade para as causas ambientais, especialmente com relação à Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Este é o ano que dá início à Década da Ciência Oceânica e também da Restauração dos Ecossistemas propostas pela ONU, com o objetivo de unir esforços globais para conservação do ambiente marinho e recuperação de biomas degradados.
Tendo conhecimento desses movimentos mundiais, nós cidadãos temos muito a contribuir individualmente, reduzindo o nosso consumo de maneira geral, mas especialmente de água e de materiais plásticos de uso único. A minha prioridade neste ano é promover a sensibilização de todos e todas para um planeta azul saudável e harmônico.
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Samela Sateremawe – bióloga, ativista ambiental e apresentadora
Meu desejo para 2021 é que as pessoas tenham mais consciência em relação aos nossos recursos naturais, como os povos indígenas têm e que elas passem a defender os defensores das florestas, porque defendendo os povos indígenas, nós estamos automaticamente defendendo a natureza. Nós sabemos que os territórios indígenas são os territórios que são mais preservados no nosso país, mesmo que seja somente 13%. Então, defender os defensores é automaticamente defender o meio ambiente.
E também votar conscientemente para governantes que tenham em mente essa causa, essa pauta, a pauta ambiental, e que fortaleçam os órgãos de fiscalização ambiental, como o Ibama, o ICMBio. Que em 2021 a gente seja mais consciente e as pessoas se importem mais com as causas ambientais, consequentemente, com o meio ambiente e os defensores, que são os povos originários.
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Namastê Messerschmidt
Minhas previsões para 2021 são animadoras. Por um lado, vemos muita gente se empenhando em fazer o bem, em ir pro campo, cuidando da terra de uma forma diferente. Essa retomada ao campo, com propósito de cuidar da terra, de regenerar o solo. Ao mesmo tempo que a gente tem esse otimismo, a gente tem uma certa preocupação, tristeza, por saber o motivo que isso está acontecendo, que é o que vivemos hoje: uma sociedade urbana consumista e um campo consumista. Um campo consumista de insumo, de agrotóxico e a gente sabe que isso tem um prazo. Uma sociedade doente, assim como a doença na agrofloresta, é um indicador do que está acontecendo no sistema, no organismo do planeta Terra. A agricultura que a gente faz hoje tira recursos.
E agrofloresta é uma tecnologia de produção que consegue gerar recursos. A gente fica esperançoso, por ver as pessoas buscando novas formas de se relacionar com a terra. Acho que é muito importante essa retomada ao campo, cuidando da terra de uma forma diferente. Acho que a grande prioridade na minha vida para 2021 é trabalhar com os cursos, usar as ferramentas atuais de plataforma de curso online, a distância, para que a gente possa espalhar mais isso pro mundo.
A gente está muito empenhado, enquanto o Agroflorestando, em construir conteúdo e tornar isso acessível para que as pessoas tenham aquilo que a gente considera de mais importante, nosso maior insumo, que é o conhecimento. Se a gente tem conhecimento, pode ser o lugar mais degradado que for, a gente consegue regenerar ele.
Em 2021, entramos no período que a ONU chamou de “Década da Ciência Oceânica e Restauração dos Ecossistemas”. É um título longo e que causa, em muitos, uma sensação de peso, de necessidade de agir, ou de medo, por não estarmos agindo o suficiente. Os últimos dois anos foram marcados por uma forte política anti-ambiental e nos perguntamos “o que 2021 nos guarda?”.
O governo Bolsonaro segue tirando as responsabilidades das suas costas, como vimos na fala do vice-presidente Hamilton Mourão, na sessão virtual da Agenda Davos 2021, sobre o capital privado na Amazônia: “é fundamental que a iniciativa privada assuma a liderança no financiamento de pesquisas e programas científicos para a região”. O vice-presidente alega inação do governo por conta da recessão econômica provinda da Covid-19.
Diante de um futuro que exige maior estímulo político e ambiental para a construção de uma sociedade mais sustentável, conversamos com especialistas que atuam, de diversas formas, em prol do meio ambiente. Eles são políticos, pesquisadores, comunicadores e educadores ambientais e listam desde políticas públicas e educação ambiental a captação de recursos para manutenção de projetos e ecossistemas. Passa para o lado e confira…
As respostas foram editadas para maior compreensão na leitura.
Sobre a autora
Juliana Aguilera
Jornalista com experiência em diversas áreas, mas que se encontrou mesmo no jornalismo ambiental e humanitário. Formada pela ESPM-SP, atualmente cursa pós-graduação em Ciência Política na FESPSP. Você pode encontrá-la no Twitter e Instagram como @_juaguilera.
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