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Exposição a incêndios florestais a longo prazo aumenta de 4 a 9% a incidência de câncer de pulmão e 10% em tumores cerebrais.

Estudo Liga Incêndios Florestais ao Aumento de Câncer e Tumores Cerebrais

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  • Juliana Aguilera
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Victoria Lobo

8 min. tempo de leitura

Exposição a incêndios florestais a longo prazo aumenta de 4 a 9% a incidência de câncer de pulmão e 10% em tumores cerebrais em pessoas num raio de 50km. No Brasil, incêndios aumentam por conta da expansão do agronegócio e dos efeitos da crise climática.

A pecuária e a soja estão diretamente ligadas à mudança no uso da terra e incêndios florestais no Brasil. Somente na Amazônia, as pastagens para pecuária foram responsáveis por 81% do desmatamento em 2020. Junto com a devastação ambiental no Cerrado e Pantanal, o quadro leva o Brasil a deter o maior número de incêndios na América do Sul

O Monitor do Fogo divulgou o espaço queimado em agosto nos biomas brasileiros e, novamente, Amazônia e Cerrado lideram o ranking de áreas degradadas, com cerca de 1,7 milhões de hectares e 1,2 milhões, respectivamente. Outros biomas registraram: Mata Atlântica (47.401 hectares), Caatinga (31.554 hectares), Pantanal (19.867 hectares) e Pampa (58 hectares). Os estados mais afetados pelo fogo foram: Pará, Mato Grosso, Tocantins, Amazonas e Maranhão, sendo os hectares queimados do 1º colocado mais que o dobro do 3º colocado. O Pará teve aumento de 110% nas queimadas em relação ao mesmo mês em 2021. Um estudo da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), publicado em na revista Frontiers in Forests and Global Change, em março, aponta que as fontes de ignição antrópicas são a principal causa de incêndios (90%) no país.

Incêndios impactam os serviços ecossistêmicos, reduzindo a qualidade da água, solo, a resiliência dos ecossistemas, empobrecendo os habitats e a biodiversidade, e afetando a capacidade de ciclagem do carbono e o clima. Além disso, os incêndios florestais causam perdas na agricultura, silvicultura e infraestrutura. Normalmente, um incêndio começa em áreas agrícolas ou periurbanas antes de se espalhar para florestas e matagais e, em áreas frequentemente queimadas, a biomassa residual se torna mais suscetível ao fogo devido à menor umidade.

O estudo destaca que o fogo é comumente associado à mudança do uso da terra, “uma vez que é uma ferramenta para desmatamento e renovação ou desmatamento de pastagens”. Essa informação é confirmada pelo Monitor do Fogo, que evidencia que a grande parte do que queimou, de janeiro a agosto, foi pastagem. E essa é uma tendência registrada há algum tempo: em 2021, o Forest Trends divulgou um relatório que afirma que não só 95% do desmatamento no Brasil foi ilegal naquele ano, como também a América Latina foi o maior ator de emissões de agroconversão ilegal no mundo, com 13,7 giga toneladas.  Para comparação: mundialmente, o setor energético emite 13 gigatoneladas, transporte rodoviário é responsável por cerca de 6 gigatoneladas e o siderurgico 3 gigatoneladas.

A pecuária foi a impulsionadora direta da maioria das conversões florestais na América do Sul e Central. “O Brasil não está sozinho na América Latina ao relatar uma taxa crescente de perda de florestas devido à agricultura comercial; o mesmo está ocorrendo na maior parte da América Latina tropical. Por exemplo, o desmatamento na Colômbia aumentou em áreas anteriormente isoladas pela guerra civil, e as florestas secas do Gran Chaco sofreram intensa conversão”, afirma o relatório. Na Argentina, a pecuária foi responsável por 65% do desmatamento ilegal, no Paraguai, 24%; na Bolívia, 50% da soja exportada é de produção ilegal e no México, 97% da carne bovina e couro estão ligados às terras agroconvertidas ilegalmente.

Perda de Florestas Tropicais na América Latina 2013-2019

Perdeu 34 Mha (quase o estado do Mato Grosso do Sul) Aumento31% em relação a 2005-2012.
Emissões: 15 Gt de CO₂ Para comparação: Em 2021, a Chinaemitiu 10,7 Gt de CO₂
O Brasil corresponde a 60% de toda perda de floresta tropical Carne Bovina74% Soja20% São as principais responsáveis pelo desmatamento no Brasil.

Fonte: Forest Trends, 2021

Em geral, uma área florestal afetada tem o histórico de: incêndios mais intensos, recorrentes, maiores áreas queimadas por evento, curto intervalo de tempo entre incêndios sucessivos e predomínio de incêndios na estação seca. Essa é uma das conclusões que o artigo da UFMG encontrou, tendo em vista que os pesquisadores analisaram queimadas entre 2001 e 2019. “De longe, o Cerrado é o bioma que experimentou os maiores eventos de incêndio com áreas que queimaram pelo menos uma vez totalizando 72 milhões de hectares no período de estudo”, destaca o texto. Em segundo lugar está a Amazônia, com 28 milhões de hectares. 

O artigo ainda avalia que os principais impulsionadores de incêndios de alto impacto são a crise climática (para 56% do Cerrado, 53% do Pantanal e 25% da Amazônia), juntamente com a mudança do uso da terra (para 75% da Amazônia, 38% do Cerrado e 25% do Pantanal). A maior parte destes incêndios aconteceram em remanescentes de vegetação nativa, principalmente em locais próximos a áreas desmatadas nas últimas décadas. 

Doenças associadas aos incêndios florestais

Incêndios florestais emitem poluentes cancerígenos que contaminam ar, água, solo e superfície terrestre. No entanto, o estudo da universidade McGill, publicado na revista Lancet em maio deste ano, aponta que são poucos os achados literários que relacionam as queimadas à risco de câncer. O artigo é o primeiro no mundo a fazer essa associação, incluindo vários tipos de câncer (pulmão, cerebral, linfoma não Hodgkin, mieloma múltiplo e leucemia), analisando 2 milhões de indivíduos de 26 a 89 anos, expostos a incêndios florestais em um raio de 20km a 50km, durante 20 anos. 

Os pesquisadores utilizaram dados do Censo Canadense de Saúde e Meio Ambiente de 1996 a 2015, excluindo indivíduos com diagnósticos de câncer de 1992 a 1995 e moradores de grandes cidades com população acima de 1,5 milhões. A exposição contínua a incêndios florestais foi associada a um aumento de incidência de câncer de pulmão (4% a 9%) e tumores cerebrais (10%), independente do morador estar a 20km de distância ou a 50km. 

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Independentemente do tipo de floresta, os incêndios florestais emitem uma mistura de poluentes nocivos, incluindo hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, benzeno, formaldeído, fenóis e metais pesados. “As pessoas que vivem em comunidades próximas podem estar expostas a poluentes cancerígenos de incêndios florestais de forma crônica”, destaca o estudo. Embora alguns poluentes retornem a concentrações normais após o término do fogo, como, por exemplo, as partículas finas, outros produtos químicos persistem no ambiente por períodos mais longos, incluindo metais pesados e hidrocarbonetos aromáticos policíclicos.

Há também um destaque para os impactos específicos em homens e mulheres: na análise de câncer de pulmão, na exposição de um raio de 20km, as associações foram mais fortes para mulheres menos expostas do que homens menos expostos. Em sua análise, os pesquisadores consideram a população que é mais exposta ao fogo, menos exposta ou não exposta nesses raios. Esse dado foi constatado na média móvel de 3 anos, 5 anos e 10 anos. Já os homens possuem maior associação na categoria mais exposta.

Tendências futuras

Períodos mais prolongados de seca já são uma realidade da crise climática no Brasil e agosto e setembro são meses de auge da estação seca em algumas regiões do país. Pesquisadores do Monitor do Fogo antecipam que os números de queimadas em setembro sejam ainda maiores na Amazônia e Cerrado. O estudo da UFMG relaciona o histórico de episódios de incêndios florestais às altas taxas de desmatamento, destacando que “esses eventos resultam de uma governança ambiental deficiente ou enfraquecida”. 

O documento ainda salienta que, apesar das grandes queimadas de 2019 e 2020, o governo brasileiro não instituiu políticas públicas adicionais de combate aos incêndios florestais. Ao contrário, o desmonte ambiental resultou, em 2021, no menor orçamento para o Ministério do Meio Ambiente já registrado no século. O Forest Trends enfatiza que o Brasil “foi bem-sucedido em reduzir drasticamente o desmatamento até 2012” e que “em seu pico, o Brasil provavelmente reduziu as emissões em mais de 1,3 Gt de CO2eq por ano”. Em comparação aos melhores anos dos EUA, Japão e União Europeia, juntos, eles reduziram suas emissões em menos de um quarto do que o valor brasileiro.

A organização aponta como sucesso na redução do desmatamento de 2004 a 2012, a combinação de liderança política, aplicação legal, restrição de crédito rural para agricultores e autorregulação voluntária da indústria. Porém, com os retrocessos dos últimos anos, a entidade acredita que uma transformação mais duradoura exigem um acordo político interno mais amplo e profundo.

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