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Colaboração: Laboratório da Moda Sustentável Une Setor Para Avançar na Sustentabilidade

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  • Juliana Aguilera
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Time Modefica

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Desde 2016, o Lab Moda Sustentável busca envolver todos os elos da rede produtiva da moda - como sindicatos, academia, associações setoriais, empreendedores e costureiras - na busca por soluções criativas e inovadoras para a indústria. A plataforma multissetorial e de colaboração é formada por mais de 40 lideranças atuantes na moda e está sob o guarda-chuva de um Conselho de Governança composto pela Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção), ABVTex (Associação Brasileira do Varejo Têxtil), OIT (Organização Internacional do Trabalho) e Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), com parceiro fundador o Instituto C&A, apoio da Pernambucanas e execução da Reos Partners.

O projeto exercita um olhar de sustentabilidade ambiental e social e busca endereçar pontos cruciais para transformação: educação, ciência e tecnologia; cultura e consumo; meio ambiente; trabalho e desigualdade; modelo de negócios e políticas públicas. Além de se empenhar para avançar na fronteira da sustentabilidade em diversas frentes, a plataforma também escala iniciativas já existentes. “Nós desenvolvemos mecanismos para financiar a moda sustentável, para fortalecer esses elos mais frágeis da rede produtiva”, explica Lucilene Dancinguer, gestora do Lab Moda. Além disso, a iniciativa também entende a importância de trabalhar em questões transversais a todos os desafios – como a informalidade – e incentiva a atuação para fomento de políticas públicas responsáveis por ajudar a abrir caminhos para negócios mais sustentáveis e inovação.

Para além de coordenar agendas dos participantes e dar sustentação para os projetos pilotos, o Lab Moda tem o desafio de atuar em um mercado distante da agenda da sustentabilidade e dos processos colaborativos. Mas é por meio da colaboração que Lucilene acredita que encontraremos as saídas para problemas complexos do setor: “a gente precisa entender todas as dimensões do problema para identificar, juntos, uma solução que ainda não existe. A diversidade de perspectivas e a inteligência coletiva permitem uma visão mais abrangente, sistêmica e a co-criação de soluções novas”.

A diversidade de perspectivas e a inteligência coletiva permitem uma visão mais abrangente, sistêmica e a co-criação de soluções novas.

Lucilene Dancinguer

Ana Yara Paulino, pesquisadora em Saúde do Trabalho e participante da plataforma desde seu início, vê neste tipo de parceria uma saída para o enfrentamento da atual situação política-social do país. “Nós não estamos em um momento em que as coisas se juntem. As coisas se espalham e a gente está trabalhando na contracorrente”, reflete, “atualmente, sem colaboração não dá pra fazer nada”. Para ela, uma iniciativa como o Lab também é importante porque leva em conta todos os agentes envolvidos e proporciona diálogos mais horizontais. Yara dá como exemplo o número de trabalhadores participantes da iniciativa, para além dos representantes das empresas e organizações patronais, o que permite maior sensibilização e diálogo entre as partes.

Resolvendo problemas complexos

Quando Sueli Pereira, gerente de comunicação e moda da Santista, foi convocada para integrar o Lab Moda, em 2016, ela não esperava encontrar tantas atuando com direitos do trabalho, de ONGs e sindicatos na primeira reunião. Por estar em outro elo da rede produtiva, a questão sobre condições de trabalho nas confecções não era tão presente no seu dia a dia, mas com a troca de conhecimentos no grupo, ela percebeu quão crítico é a questão da sustentabilidade social no Brasil. “O interessante para mim é isso, essa visão sistêmica, para além do seu jardim. Quando você entra no Lab, você tem a dimensão do que é sustentabilidade”, afirma.

Há anos atuando num segmento cheio de desafios socioambientais, Sueli enxerga na colaboração uma forma de fortalecer práticas mais sustentáveis. “Por exemplo, a minha equipe desenha uma peça que vai para a lavanderia. Se você não conversa com o pessoal de química, com o pessoal técnico, ou seja, com o pessoal da lavanderia que vai trabalhar com o pedido, você não tem noção do processo e não consegue fazer melhores escolhas”, exemplifica ela. “O que eu percebo hoje é que você meio que delega a sustentabilidade para o outro”. O Lab Moda vem para afirmar que a responsabilidade é compartilhada.

Além de ser um grande incentivador da promoção de diálogos horizontais, de proporcionar uma visão sistêmica para os atores envolvidos na rede produtiva da moda e fazer conexões importantes e necessárias para o avanço de melhores práticas, a plataforma também cria e fomenta iniciativas. Lucilene cita uma delas, considerada a “vitrine” do Lab Moda, o Tramando Juntas, um espaço para fortalecer o trabalho de costureiras autônomas em São Paulo, promovendo remuneração justa e condições de trabalho dignas. Atores diversos se uniram para colocar a iniciativa de pé, buscar recursos e tirar o projeto do papel. A expectativa é ver mais iniciativas se materializar ao longo do tempo.

A outra face da colaboração

Para trabalhar em conjunto é necessário transpor dificuldades internas, do grupo, e externas, do mercado. O Lab Moda é composto por profissionais de diversas áreas, nem todos da sustentabilidade, que dividem em conjunto problemáticas e ideias do seu círculo de trabalho. Ana Yara elenca como um dos desafios chegar a consensos. “Tem que estar aberto a construção coletiva, não basta a empresa, o local de trabalho, indicar uma pessoa para representá-la. É preciso um comprometimento real”, afirma. Nesse sentido, colaborar também significa saber ceder e se abrir à escuta.

Já para Sueli, encaixar a sustentabilidade dentro da agenda cotidiana de trabalho também é uma questão que demanda esforços, principalmente quando é necessário envolver outros profissionais da empresa na pauta: “o grande desafio é coordenar essa agenda e entender até onde você pode contribuir e onde outras pessoas, desde a diretoria à presidência, têm que contribuir. É uma rede complexa, você lida com as cabeças mais diferentes possíveis”.

O mercado também é outro desafio externo. Sueli conhece dois comportamentos típicos de empresas: as que dizem “ainda não é a hora certa de falar (sobre sustentabilidade)”, e outras que mandam e-mail tentando entender e querendo se envolver. “Não existe mais não falar nisso. (A sustentabilidade) tem que estar na tua primeira pauta. Eu acho que o desafio do nosso setor, ainda mais no momento que o Brasil passa, é que as pessoas estão preocupadas com a sobrevivência do dia a dia. Poucas empresas olham para o futuro”, reflete.

Para ela, em uma indústria tão competitiva, colaborar é difícil, mas há um movimento acontecendo, muitas empresas já entenderam que não vão fazer a diferença sozinhas. Sueli passou pela experiência de receber uma empresa concorrente na Santista, apresentar para eles seu modelo de neutralização de CO2. A empresa adotou o método, que poderia ser visto como vantagem competitiva e, por esse motivo, algo a se manter em segredo, mas ela entendeu que não deixaria de ganhar por isso. Agora, afirma ela, todo mundo ganhando.

De olho no futuro e na inovação

A necessidade de encontrar e viabilizar soluções para a sustentabilidade ambiental e social da indústria da moda é latente. Falamos em um momento no qual novos formatos estão sendo testados, e a Natureza dá sinais claros do desgaste promovido pela mão humana. Neste momento, o diálogo é chave fundamental para encontrar novas perspectivas. “A gente está em uma conjuntura social e política complicada. Com todo esse conservadorismo, (o Lab Moda) é um grande passo de discussão, de diálogo social, que eu acredito serem necessários para transformação”, reflete Ana Yara.

Por outro lado, há uma questão de sobrevivência das próprias empresas. Sueli acredita que o têxtil já chegou em um patamar de inovação limite. Para inovar a partir de agora, será preciso muita troca e trabalho compartilhado. Para ela, colaborar com outros atores permite uma visão sistêmica, além de escapar de armadilhas e aprender com os erros de forma coletiva. Esse mix, que ela já provou no Lab Moda, também traz vantagens como projetar caminhos mais originais, encontrar uma demanda que você nunca havia enxergado. “Quem faz assim vai adiante, enxerga coisas que os outros não têm”, conclui.

Instituto C&A e Modefica se uniram para uma série de pautas que mostram o que está acontecendo no Brasil no âmbito de inovação, tecnologia e colaboração na indústria da moda. Convidamos nossas leitoras e leitores a refletirem sobre os desafios, conhecer e chegar junto às soluções. Não perca as próximas publicações, se inscreva na nossa newsletter. Desde janeiro de 2020, o Instituto C&A passou a operar com o nome de Laudes Foundation. Para mais informações acesse www.laudesfoundation.org.
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